Cirurgia Hepática

A cirurgia do fígado constitui a área mais complexa da cirurgia abdominal. Para dominar essa área tem que reunir conhecimentos profundos de anatomia, patologia, cirurgia convencional, laparoscopia, radiologia e oncologia.

Indicações

A resseção de fígado é motivada por lesões tumorais primárias ou secundárias, ou por lesões benignas de comportamento incerto (como por exemplo adenomas ou cistos hidáticos).

Tratamento

Só a resseção de tumores do fígado pode dar esperança de cura para estas doenças. A remoção de lesões hepáticas está dependente de vários fatores que têm que ser judiciosamente pesados para julgar a viabilidade do fígado restante e portanto do doente. A avaliação inclui o tamanho tumoral, localização, qualidade e quantidade de fígado após a resseção.

As emergentes abordagens laparoscópicas ao fígado revelam claras vantagens sobre a cirurgia convencional. A laparoscopia traz menos perdas de sangue, menos dor, menos complicações respiratórias, recuperação mais rápida e menor risco de complicações de parede abdominal (como hérnias e infeções).

Cirurgia

Uma diversidade de técnicas poderão ser usadas na abordagem do fígado. Nas cirurgias convencionais a incisão mais comum é a subcostal direita iniciando-se na linha média abaixo do esterno e terminando na região dorsal. Tem uma dimensão de ~40 cm. Nas abordagens laparoscópicas são usadas 4 ou 5 pequenas incisões (de 5 a 10 mm) e uma incisão acima do púbis para retirar a peça cirúrgica. O planejamento da intervenção é crucial para o sucesso. Este é complementado com ecografia intra-operatória.

Na resseção de tumores é fundamental manter uma margem de segurança para conseguir a erradicação microscópica da doença. Outra preocupação é a perda de sangue que deverá ser minimizada.Para isto contribui uma técnica cuidadosa, uma anestesia especializada, manobras preventivas e a laparoscopia sempre que possível.

Pós operatório

Nas cirurgias convencionais, o controle da dor é um dos aspectos fundamentais para assegurar o bem estar do doente no pós operatório e diminuir as suas complicações respiratórias. A monitorização das perdas de sangue e do funcionamento do fígado serão aspectos chave para a boa recuperação. Outra complicação frequente é a fístula biliar. Esta pode implicar re-intervenção, endoscopia (CPRE) ou simplesmente esperar.

Em cirurgias em que o fígado restante é insuficiente para a recuperação pós operatória, poderá estar indicado um pre-condicionamento vascular para preparação do órgão para a resseção. Estes procedimentos, como a embolização da porta, são realizados cerca de 3 semanas antes da intervenção.

Habitualmente quando o doente tem alta hospitalar após resseção do fígado já passou a fase de perigo e apenas tem que se poupar de substâncias tóxicas como álcool, certos medicamentos e gorduras.

Cirurgia do Pâncreas

A cirurgia pancreática por tumor constitui um verdadeiro desafio onde o bom resultado depende da preparação, execução e acompanhamento. Este entendimento global do problema tem clara repercussão no resultado final.

Indicações

A indicação mais frequente para operar este órgão é oncológica. São candidatos a cirurgia pancreática todos os doentes com lesões sólidas suspeitas do parênquima do pâncreas ou peri-ampulares (em redor da ampola de Vater). Outro grupo de doentes com eventual indicação são os casos de pancreatite complicada.

Tratamento

A remoção radical de tumores do pâncreas ou peri-ampulares constitui a única esperança de cura para estes doentes. A intervenção quando possível deve ser feita por via laparoscópica. Poupar ao máximo o órgão traz benefício ao doente.

Cirurgia

As resseções anatômicas do pâncreas podem ser divididas em: (1) cabeça – duodenopancreatectomia cefálica (DPC) ou (2) corpo e cauda – pancreatectomia distal (PD). Em pequenos tumores benignos ou de comportamento incerto podemos optar por enucleação – remoção do nódulo.

A DPC é uma cirurgia radical e complexa que envolve habitualmente a resseção em bloco de parte do estomago, duodeno, vesícula e via biliar e cabeça do pâncreas. A isto associa-se a remoção alargada de gânglios linfáticos regionais. Realiza-se por via convencional com uma incisão supra-umbilical de ~30 cm.

A PD dependendo da radicalidade poderá ou não implicar a remoção associada do baço. Também engloba a resseção em bloco de gânglios regionais. Estas intervenções são realizadas por via laparoscópica.

Na pancreatite aguda complicada poderá haver necessidade de várias abordagens minimamente invasivas ou não. Assim poderá haver indicação para drenagem percutânea de coleções, remoção de necrose por laparoscopia ou retroperitoneoscopia e drenagem de coleções para o estomago ou jejuno (via laparoscópica).

Pós operatório

A atividade enzimática do pâncreas (digestão) condiciona uma gama de possíveis complicações destas intervenções. A DPC é a mais complexa destas cirurgias pela montagem digestiva que implica. as numerosas anastomoses (junções entre órgãos) estão dependentes de vários fatores para uma boa cicatrização. A DPC tem hoje uma mortalidade inferior a 5%, mas uma morbilidade (risco de alguma complicação) que ronda os 50%. O tempo de internamento é em média de 15 dias.

Na PD o risco maior é de fístula pancreática (~20%). Habitualmente esta complicação trata-se com medidas conservadoras. Quando esta cirurgia é feita por via laparoscópica a recuperação é rápida com internamento médio de 6 dias. Doentes esplenectomizados (que retiraram o baço) devem fazer vacina anti pneumocócica, anti hemófilos e anti gripal.

Colecistectomia por via Laparoscópica

Indicações

A razão mais comum para realizar esta operação é a presença de pedras na vesícula biliar associada a sintomas de dor abdominal, indisposição ou vômitos. Em determinadas circunstâncias, doentes com muitos cálculos pequenos ou com um só cálculo de grandes dimensões podem ter indicação para ser operados mesmo na ausência de sintomas.

Outra causa menos frequente são os pólipos vesiculares com mais de 1 cm ou a suspeita de tumor da vesícula.

Tratamento

O principal objetivo da cirurgia da vesícula é evitar complicações futuras decorrentes das pedras. As consequências da doença podem na verdade ser muito nefastas e vão desde a colecistite aguda (inflamação aguda da vesícula que conduz a cirurgia de urgência) à passagem dos cálculos para os canais biliares podendo provocar icterícia, colangite aguda ou pancreatite aguda. Todas estas situações podem ser muito graves, obrigando a internamento e pondo, em certas circunstâncias, a vida em risco.

Também é verdadeiro que as pedras na vesícula durante muitos anos aumentam a incidência de câncer. Quanto aos sintomas, a cirurgia melhora sobretudo as crises de dor. A indisposição condicionada pelos alimentos gordurosos só melhora em metade dos doentes operados.

Cirurgia

A operação é feita com uma tecnologia que permite a visualização dos órgão abdominais com a introdução de uma câmara que transmite a imagem a um monitor (laparoscopia). Para tal insufla-se o abdomen com gás (dióxido de carbono) e introduzem-se os instrumentos através de quatro pequenas incisões (3x5mm + 10mm). A vesícula é removida desta forma e no final o gás é aspirado.

Em circunstâncias raras (<1%) é necessário converter a cirurgia laparoscópica numa cirurgia convencional, obrigando a uma incisão de cerca de 20 cm. Esta situação é mais comum quando já houve cirurgias abdominais prévias.

Pós operatório

No dia da intervenção o doente fica habitualmente com soro e inicia uma dieta liquida. A alta hospitalar ocorre nas primeiras 24h.

Por vezes há doentes que têm dificuldade em iniciar a dieta por náuseas e vómitos. Habitualmente estes são secundários à medicação e passam espontaneamente ou com uso de fármacos específicos. O início da alimentação deve ser retomado logo após a cessação dos vômitos.

Na alta, o doente leva uma receita com dois analgésicos que serão para tomar só enquanto houver dor. A incisão que usualmente/ causa mais desconforto é a da região do umbigo. É por aqui que a vesícula é retirada e portanto é o local mais sujeito a trações. Metade dos doentes submetidos a laparoscopia têm dor referida ao ombro nos 2-3 dias após a cirurgia. Trata-se do reflexo da distensão do diafragma durante a intervenção.

Ao ir para casa o doente pode vestir a sua roupa e deambular à vontade. Quando se sentir com forças pode ir à rua. O tempo de convalescença é de uma semana, após o que é normal retomar o trabalho. A dieta deve ser sem gorduras nas primeiras duas semanas. Depois começa-se a introduzir outros alimentos gradualmente.

Cerca de metade dos doentes ficam com o trânsito intestinal acelerado após a colecistectomia. A queixa mais frequente é uma vontade urgente de defecar após a refeição. As fezes são menos sólidas. Este novo ritmo do intestino aproxima-se do antigo gradualmente até seis meses de operado.